Um dia eu fiz algo na vida que me orgulharia pelo restante dela.

  Não tinha ideia do que estaria por vir, muito menos das coisas que deixei de viver, ao teu lado ou para aprendizado da vida mesmo.

  Hoje revendo minha trajetória, sinto que tenho algo a lhe falar, pois começo já, aja visto que minha hora está por acabar.

  Começo pela parte fácil, aquela que ainda me agrada, quando ainda convivíamos, talvez não se lembre, mas quando eu chegava em casa seus olhos brilhavam e seus braços para mim se abriam, mas normalmente eu estava embriagado e nem dava importância, isso me faz falta até hoje.

  Mesmo eu sendo tão rude e áspero você me chamava de PAI e sorria, eu lamentavelmente ignorava, menosprezando um sentimento lindo vindo de meu filho.

  Você foi crescendo né, longe de mim, pois antes de você tomar ciência do que era seu PAI, você foi embora, juntamente com minha esposa, talvez os destratos e a falta de sensibilidade acabaram com o casamento, isso eu ainda guardo magoas, mas não é pertinente agora esse assunto.

  Cresceu meu filho, não acompanhei sua ida á escola no primário, nem ouvi seu choro pedindo para ficar em casa, com medo de estranhos e de uma coisa que parecia incerta, sua mãe em prantos o deixava lá.

  Acostumado com a escola começou a fazer amiguinhos, irem juntos no parquinho, eu perdi isso, mas você começa a questionar, porque todos teus amigos tinham um Pai e justamente você não.

  E você continuou crescendo, esses amiguinhos se reduziram, mas você continuava enfrente, jogando bola, empinando pipa, brincando e sendo criança e eu perdendo isso tudo, pois preferi me manter á distância.

  Filho depois disso, eu deixei também de acompanhar você na fase difícil da “aborrescência”, não participei da sua entrada no mundo adulto, não te expliquei  quão doido é o primeiro amor não correspondido, nem expliquei que as brigas devem ser evitadas e que aos adultos sempre deve ter respeito.

  Não expliquei o que é necessário para ter aquele conversa com a menina que você gostava nem como funcionava o corpo humano, você aprendeu na marra, imagino que deve ter tomado banhos demorados, sem saber direito o que estava ocorrendo.

  Você começou a trabalhar, e eu longe, não te falei como é a vida de um trabalhador, acordar cedo, receber pouco e ter que dar o seu melhor, mas você superou isso tudo.

  Também meu filho, não te fiz entrar na faculdade, nem ver sua colação de grau, como você já tinha se acostumado, nem percebeu, pois desde a infância eu não aparecia.

  Mas apesar disso, você seguiu enfrente, trabalhou,  se formou e cresceu, agora revendo isso tudo, nos últimos suspiros da minha vida, eu tenho uma certeza, você foi durante a sua vida o que eu estou me tornando agora no final dela, me arrependo do dia que ignorei teu olhar por um gole de cachaça, mas agora depois de velho e doente, eu vejo que o melhor que fiz, foi ter deixado você voar sozinho, pois agora eu sirvo como um exemplo de PAI  que você não deve se tornar.

  Tenho certeza que meu legado foi deixado, bem ou mal Deus decidirá, mas tenho certeza que o homem que se tornastes, foi a melhor coisa que fiz na vida.

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